Cogito, ergo sum

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Entrevista comigo sobre financiamento de campanhas na Agência de Notícias USP

 

Olá, pessoas!!!

Estou postando aqui o link para uma entrevista que dei para a Agência USP de Notícias sobre o tema da minha dissertação, Igualdade política e financiamento de campanhas eleitorais (para baixar a dissertação, clique AQUI). É ano eleitoral e os olhares se voltam pra esse tipo de tema, mas espero que as pessoas estejam mais atentas a este tema todos os anos, pois é de extrema importância para que tenhamos uma democracia realmente eficiente (quem sabe um dia…).

O artigo se chama Financiamento misto é mais adequado para política do país, e vocês podem acessar clicando na imagem abaixo:

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sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

"O Haiti é aqui, o Haiti não é aqui"

Terremoto no país mais pobre das Américas deixa cerca de 100 mil mortos.

Isso toca MESMO, isso nos faz solidários MESMO, assim como quando tornados, tsunamis, deslizamentos e outros desastres naturais afligem determinada população/território.

O que chama a atenção, já há muito tempo, é como a aparição e insistência, durante certos períodos, de determinado assunto na mídia causa comoção instantânea em pessoas totalmente alienadas que, por minutos, horas ou dias (nada mais que isso) são tomadas por terrível assombro, solidariedade e consciência social.

Depois, quando a mídia deixa aquele assunto, ele simplesmente é esquecido.

Os desastres de ordem natural causam solidariedade e entristecem, talvez por afligirem a todos, independentemente de sua classe social, etnia, grau de escolaridade, idade… Causa terror, porque pode acontecer, em tese, a qualquer um: ninguém está livre de ir passear num paraíso tropical e ser surpreendido por um tsunami ou deslizamento, por exemplo.

Já as questões sociais, a guerra diária, a injustiça diária, a corrupção diária, a fome diária, as doenças diárias causadas pela desnutrição, pela falta de saneamento, essas parecem não causar tanto terror. Será porque a impressão que se tem é de que a guerra esteja limitada a determinadas regiões, a violência a determinadas classes, sobretudo as que se encontram nas regiões periféricas da cidade e dos países?

Por que as mesmas pessoas que apresentam tanta comoção com o terremoto em Haiti nem sabem dos problemas sociais que aquele país - cuja renda per capta é cerca de 1/3 da encontrada na Favela da Rocinha, cuja a economia se concentra no setor primário, cuja instabilidade política vem preocupando a analistas políticos do mundo todo – vem enfrentando há décadas, há séculos. A maioria dessas pessoas sequer tinham consciência destes dados, acredito eu. O Haiti é um país que vem passando por inúmeros problemas sociais, políticos e econômicos ao longo do tempo. Falta estrutura interna, falta educação, política bem feita, consciência do próprio povo, falta muita coisa.

Lembro-me, ainda, nestes momentos, de um texto sobre o indivíduo blasé que li numa das minhas aulas de Sociologia. O indivíduo, nas sociedades modernas, recebe tantos estímulos de todos os lados que, se ele fosse se sentir tocado ou se envolver com todos eles, acabaria louco: de cada notícia de assassinato, de roubo, de guerra lida nos jornais a cada mendigo com o qual cruza ao longo do dia, mendigos, estes, que acabam passando desapercebidos, como se fossem parte da paisagem urbana.

O que quero dizer é: chega de hipocrisia, de agir como o consciente, o mensageiro das causas dos desabrigados quando algo é amplamente televisionado, noticiado nos jornais e na internet. Coloque a mão na sua consciência, e pense um pouquinho por dia nos problemas da sociedade na qual você está inserido, pense no que pode ser feito, no posicionamento que você pode ter em sua vida, em seu ambiente particular, não sendo violento, sem ética, corrupto, roubando e tirando proveito dos outros. Pense no que você pode fazer pelo seu país, pela sua cidade, pelo seu bairro, pelos seus familiares!!! E acho que isso se encaixa mais ainda às pessoas que vivem num país como o Brasil, cheio de problemas, de desigualdades, de corrupção, de malandragem.

Esse já seria um excelente começo.

E, pra terminar, vou ser muito honesta com vocês: os desastres naturais me entristecem, claro, mas os desastres sociais me entristecem muito mais, não tem comparação, não tem, e sabem por que? Porque, na minha análise, os desastres naturais, muitas vezes, não poderiam ser evitados, já os sociais, poderiam, todos eles. Se não foram, foi por falha humana, normalmente originada pela falta de consciência social, de honestidade e de comprometimento com o todo: seria mais ou menos como a sensação de não pertencimento ao grupo, de querer tirar uma vantagem porque, no fim das contas, não vejo o outro como meu igual, não vejo o sofrimento do outro como algo que atrapalha a caminhada da nação à qual pertenço. A mim a injustiça e a catástrofe causada pela ação (ou falta de ação) humana me causa muito, muito mais horror.

É isso.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O dia em que São Paulo parou

7 de dezembro de 2009, final da noite: a chuva começa, totalizando 1/3 do volume de chuvas esperado para o mês de dezembro. 8 de dezembro de 2009: a maior e mais importante cidade da América do Sul amanhece parada. Uma centena de pontos de alagamento, muitos deles intransponíveis. Mais 4 mortos. Muitos deslizamentos, pessoas ilhadas, quantos contrairão alguma doença decorrente da água suja que se espalha pelas ruas, é difícil dizer.

O conglomerado impermeável no qual São Paulo se tornou é o resultado do crescimento desenfreado desta cidade. As chuvas intensas, dizem, resultado do aquecimento global.

Vamos parar e pensar um pouco.

Tudo que vivemos no mundo de hoje é resultado de tudo que a humanidade tem feito desde que pisou neste planeta. A Revolução Industrial teria dado início ao que provocou o já mencionado aquecimento global e cujas consequências são conhecidas e debatidas, de maneira substancial, há pouco tempo, menos de uma década. Porém, nos últimos anos, poucos que têm acesso à TV, à internet, aos jornais ou a qualquer veículo de disseminação de informação nunca ouviram falar sobre o caminho que o planeta Terra vem trilhando “graças” à ação humana. Falta de água, superaquecimento, desastre naturais. Some-se a isso, no caso de São Paulo, o solo impermeável, de concreto, que não permite que a água das chuvas encontrem vazão. Lixos distribuídos pela rua tapam bocas de lobo.

Se todos sabem o que acontece, se todos sabem dos problemas do planeta e, mais especificamente no caso de São Paulo, se todos sabem que em toda primavera-verão é a mesma história, chuvas e enchentes para dar e vender, por que nada é feito? Por que nada é cobrado? Por que com o fim da época das chuvas a população se esquece do caos que vive todos os anos?

É um caso a se pensar.

sábado, 24 de outubro de 2009

Rio de Janeiro, Outubro de 2009: mais uma vergonha nacional

Enquanto um país permitir que uma cidade entre em guerra de igual para igual entre polícia e tráfico, esse país viverá em vergonha.

Enquanto um país permitir que uma cidade fique à merce do desejo de bandidos, esse país viverá em vergonha.

Vergonha de um Estado fraco, falho e corrupto. Um Estado cujos braços não alcançam regiões significativas de uma cidade, que conhece o sentido mais amargo da anomia.

Dizem que os que comandam o tráfico não podem ser presos, porque já estão presos, comandando este mercado ilegal, esse tumor das sociedades modernas, de dentro das paredes das penitenciárias de “segurança máxima”. Mas será que estão presos mesmo? Ou será que os verdadeiros líderes não se encontram em posições, digamos assim, “intocáveis”?

Qual será o sentimento das famílias desses civis que são atingidos nessa guerra urbana que, na verdade, nunca para? Qual será o sentimento? Imagino que seja um sentimento de revolta muito, muito grande, capaz de tornar o resto de suas existências muito amarga e dolorosa.

Quando os indivíduos vivem em situação frequente de medo, de insegurança, de desconfiança, como ocorre no Brasil, questões importantes da psicologia e da sociologia dessa sociedade, passam a ser observadas (ainda me lembro muito bem do que São Paulo viveu em maio de 2006, quando criminosos acreditaram ter o poder da cidade, e a população reforçou fortemente essa crença, sentindo, então, o quão importante é o "tal braço armado" do Estado).

Como pode um país que não dá conta de seus famintos, de seus traficantes, de seus políticos corruptos, abrigar uma Copa do Mundo e uma Olímpiada. Será que esse país não tem coisas mais importantes com as quais se preocupar? Ou será que isso prova, mais uma vez, que o povo brasileiro é o exemplo vivo da máxima romana “panis et circenses”?

Alienação, anulação, ignorância, aversão ao conhecimento de tudo que diz respeito à vida civil, à vida política, à justiça. Apenas num país de mansos políticos fazem e desfazem, mandam e desmandam, roubam e riem da cara do cidadão ano após ano, século após século. Apenas num país de mansos.

Falta ao povo brasileiro menos acomodação no que diz respeito à coisa pública e mais envolvimento com o país, envolvimento genuíno, e não envolvimento em época de futebol e de fórmula 1.

Não posso dizer que chego a sentir vergonha de ser brasileira, porque não sinto vergonha de nada do que me tornei ou do que fiz, ainda que sinta que tantos anos de estudo e trabalho em prol de um país melhor, de pouco serviram. Mas sinto decepção, desilusão e um pouco de nojo.

Nojo do país que não tem mais jeito.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Link que dá acesso à minha dissertação de Mestrado

Como muitas pessoas aqui sabem, defendi minha dissertação de mestrado em março deste ano, com o título de Igualdade política e financiamento de campanhas eleitorais. Foi um filho que nasceu depois de longos anos de gestação e de trabalho de parto que, fiotes, aconteceu “de um tudo”. O tema é extremamente atual, o financiamento de campanhas, analisado sob uma ótica nova para o tema, a da teoria da justiça.

Eu acho que lendo esse trabalho e o trabalho de colegas, também disponíveis no banco de teses da USP (e de outras grandes universidades de ponta do Brasil), dá pra notar que material e caminho pra melhorar este país tem de monte, soluções são dadas pela classe pensante o tempo todo, só falta mesmo é vontade de mudar “Só”.

Para quem quiser ler meu trabalho, segue abaixo o link para baixar o arquivo em pdf.:

http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-07052009-170520/

sábado, 15 de agosto de 2009

Empresa: Religião

Essa história é antiga, é de conhecimento geral mas, com a disputa entre as emissoras, está no foco da discussão novamente.

Religião vem de religare, significa ligar o ser humano a algo maior, o que a religião poderia trazer.

Para muitos a religião é vista como fruto de criação divina, mas quem conhece um pouco de sociologia e antropologia sabe que a religião, tal qual se apresenta atualmente é, na verdade, fruto da criação humana.

A religião tem várias funções, e, na sociedade brasileira, dentre elas estão a de acalmar e ajudar as pessoas a aceitarem as agruras da vida, na fé de que algo maior sabe o que faz e de que uma hora a justiça será feita. A religião também tem a função social de reconhecimento, pertencimento e coesão.

Porém, algumas religiões sempre estiveram ligadas à questão financeira.

O que vemos são algumas religiões que, na verdade, não passam de empresas. Instituições que levam as pessoas a crerem, que as orienta de uma maneira não destrutiva ou auto-destrutiva, que lhes dá algum tipo de paz, é algo positivo. Mas, quando essas instituições passam a atuar como empresas que visam ao lucro, mentindo, ludibriando, praticando ações ilícitas, aí algo deve ser visto.

É bem verdade que cabe à população, aos cidadãos em geral desenvolverem um senso crítico que deve funcionar como um alerta, mesmo em momentos de crise e desespero. Na falta deste alarme, o Estado deve atuar. A justiça deve atuar.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Lula e o Mensalão

3.4. O problema do “caixa dois” e o “Mensalão”


É de comum acordo, dentre os analistas políticos do caso brasileiro, que os números apresentados nas prestações de contas não refletem completamente a realidade. Existe a desconfiança da existência do chamado “caixa dois” em praticamente todas as campanhas.

Bruno Speck (2003a, p.9) observa que o motivo principal dessa disparidade de informações não está no desconhecimento da legislação ou na tentativa de contornar limites e vetos contidos na legislação vigente. As informações sobre a legislação são detalhadas e abrangentes, e a Justiça Eleitoral procura desenvolver um trabalho contínuo na disseminação desta informação.

Um ponto específico da legislação pode gerar dúvidas no processo do financiamento político, abrindo brechas para possíveis fraudes, qual seja: “todo cidadão poderá contribuir com até mil UFIR para campanhas, sem que estas contribuições precisem ser declaradas na prestação de contas do candidato beneficiado” (Lei Eleitoral, art. 27) (SPECK, 2003a, p.9) – aqui facilita-se a entrada de contribuições anônimas, ainda que somente de pessoas físicas, com a justificativa de tratar-se de aportes não registrados por cidadãos diversos (SPECK, 2003a, p.9).

Aqui toma forma uma importante questão: em sendo a legislação brasileira relativamente liberal no que se refere às doações privadas, e se os candidatos correm o risco de terem sua candidatura ou mandado cassados, caso seja verificada alguma irregularidade, o que motivaria a existência de um “caixa dois”?

Dentre as respostas a este questionamento encontra-se uma bastante grave, referente à origem dos recursos destinados ao “caixa dois”. Normalmente este dinheiro é proveniente de ações ilícitas, tratando-se de dinheiro não declarado da empresa, ou seja, oriundo de sonegação de impostos, tendo origem em um “caixa dois” já dentro da mesma ou dinheiro proveniente do crime organizado; o destino do dinheiro é ilícito, ou seja, trata-se de valores destinados a gastos com cabos eleitorais, compra de votos, etc; ou a motivação da doação é ilícita, tendo como objetivo a compra de favores e influência (SPECK, 2003a; FLEISCHER, 2000). De acordo com David Samuels, as empresas são responsáveis pela maior parte dos recursos disponíveis aos candidatos – valendo ressaltar que são poucas as empresas que doam[1], e sobretudo ligadas a setores econômicos especialmente vulneráveis à intervenção ou regulação governamental, como o setor financeiro (inclui bancos), o setor da construção (dominado por empreiteiras e outras firmas do setor da construção civil) e o setor da indústria pesada (como aço e petroquímicas) (SAMUELS, 2003a, p.372-376). Deste modo, providenciar que as empresas tenham menos incentivos para manterem grandes somas de dinheiro fora do sistema bancário e não declarado ao governo, é uma das únicas maneiras de se eliminar o “caixa dois” (SAMUELS, 2003a, p.386).

O tema do “caixa dois” ganhou grande notoriedade no cenário político brasileiro no ano de 2005 quando, ao final do terceiro ano de mandato do Presidente Lula, a política brasileira defrontou-se com o episódio que é considerado o maior esquema de “caixa dois” já tornado público na política brasileira: o chamado “Mensalão”.

O então deputado e presidente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Roberto Jefferson denunciou o esquema, que quase destruiu o governo do Presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores (PT). A denúncia ocorreu porque Jefferson confessou que havia negociado pagamentos num total de 20 milhões de reais com dirigentes do PT, mas recebera apenas 4 milhões. Sentindo-se traído, resolveu tornar público o esquema. Esta denúncia acabou desencadeando

uma enxurrada de revelações de fraude, lavagem internacional de dinheiro, financiamentos ilegais de campanhas eleitorais, compra de votos de parlamentares, contratos governamentais ilícitos e o roubo de grandes somas de prefeituras e de bancos, grandes empresas e seguradoras pertencentes ao governo federal, além de investimentos muito suspeitos feitos por fundos de pensão ligados ao setor público (GALL, 2005, p.1).

A maior transferência conhecida de dinheiro até então envolvia R$15,5 milhões pagos à Duda Mendonça, marketeiro da campanha de Lula. Mendonça afirmou, na CPI, que recebera o dinheiro, parte dos R$25 milhões cobrados por ele para desenvolver a campanha de mídia de Lula, sabendo que ele era proveniente de “caixa dois”, mas que era a única maneira de receber o valor que estava pendente. Estima-se que, no total, cerca de 2 bilhões de reais estavam envolvidos no esquema, sem origem definida. Embora pagamentos não registrados e transferências entre contas clandestinas no exterior sejam tolerados há muito tempo na política brasileira, operações de tamanha magnitude e o esquema de pagamento de propinas em valores tão altos em dinheiro foram uma surpresa para a opinião pública (GALL, 2005, p.4).

O PT desenvolveu este esquema com o intuito de conseguir poderes ampliados para Lula e o partido através da compra de votos da oposição, mas as denúncias acabaram com essas expectativas e quase derrubaram o governo. De acordo com autores como Norman Gall (2005) e Francisco de Oliveira (2006) o episódio manchou a imagem de Lula e do PT, sobretudo pelo posicionamento que adotavam até então, resultando em perda do patrimônio ético e moral do partido. Lula era a imagem da esperança de ascensão para brasileiros que se encontravam em classes desprivilegiadas e, tanto ele quanto o partido, levantavam a bandeira de ética e moral na política, denunciando escândalos reais ou não em governos anteriores.

Instaurou-se uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) durante o período de 21 de julho de 2005 e 17 de novembro de 2005, para averiguar as acusações e concluiu-se que houve a distribuição de recursos ilegais a parlamentares com periodicidade variável mas constante durante os anos de 2002 e 2003, ainda que não tenha sido possível definir se essa periodicidade era mensal, como afirmava Jefferson. Diversos membros do governo tiveram seus nomes associados ao escândalo[2].

Bresser-Pereira (2006, p.38) teceu o seguinte comentário sobre o episódio:

O governo Lula e o PT reconheceram as irregularidades, mas tentaram identificá-las com “caixa dois” em campanhas eleitorais, ou seja, com doações de dinheiro não declaradas ao fisco e aos tribunais eleitorais. Dessa forma, o PT estaria fazendo algo usual no processo de financiamento de campanhas eleitorais. Ao longo desse escândalo, porém, foi ficando claro que o processo envolvia corrupção stricto sensu, seja pela compra de votos de deputados de outros partidos, seja pelo fato de os recursos provirem de empresas estatais cujos contratos de publicidade eram sobrefaturados ou de fornecedores do Estado, que compensavam as doações com sobrefaturamento dos serviços. Além disso, não se tratava de simples financiamento de campanhas eleitorais, já que o sistema passou a fazer parte do governo federal, como antes fizera parte dos governos municipais em que o PT elegera o prefeito. (BRESSER-PEREIRA, 2006, p.38)

Em entrevista concedida em 2005, o Presidente Lula, tentando “minimizar” o episódio, declarou que “o que o PT fez, do ponto de vista eleitoral, é o que é feito no Brasil sistematicamente” (GALL, 2005, p.5). Tal declaração remete a uma outra declaração dada em meio a outro grande escândalo político vivido pelo Brasil pós-redemocratização – a renúncia de Fernando Collor de Mello, em 1992, primeiro Presidente eleito da história da América Latina a sofrer impeachment, após a descoberta de um esquema de grandes proporções de pagamento de subornos e comissões ilícitas ao seu governo – por Paulo César Farias, tesoureiro da campanha de Fernando Collor de Mello, próximo ao julgamento de impeachment, quando ele fez a seguinte declaração na CPI: “Estamos todos sendo hipócritas. Ninguém obedece à lei do financiamento de campanhas”.

Sem dúvida alguma a maneira como o financiamento de campanhas parece ser encarado por políticos e demais atores envolvidos na política brasileira, é alarmante. As declarações acima nos remetem à idéia de falta de fiscalização e de impunidade presente no sistema político brasileiro. Trata-se de uma cultura política corrupta e deteriorada, arraigada na classe política, que pede medidas urgentes para que o financiamento político possa ser encarado sob seu aspecto mais nobre: o de fundos para promover a competição política livre, igual e justa, e não como uma maneira de colocar em prática atos corruptos e ilegais, de suborno, compra de acesso e compra de influência, dentre outros atos ilícitos.

Face aos problemas enfrentados, o debate contido no Projeto de Lei 2679/03, que propõe o fim do financiamento privado no Brasil e a exclusividade do financiamento público, ganhou força no cenário político brasileiro (ABRAMO, 2005, p.6).


[1] Aqui Samuels (2003) chama a atenção para o fato de, além das empresas dominarem o cenário das doações a candidatos políticos, tanto as doações provenientes de pessoas físicas quanto as provenientes de pessoas jurídicas estão concentradas em poucos doadores. Poucas pessoas físicas fazem doações, em comparação com a população total do país, e muitos dos contribuintes são parentes do candidato, pois possuem o mesmo sobrenome (Samuels chegou a esta conclusão analisando os dados do TSE de 1994 e 1998), e relativamente poucas empresas fazem doações por candidato. Esta situação reflete o cenário socioeconômico do Brasil: poucos são os doadores, porém doam altos valores, espelhando a distribuição desigual de renda presente no país.” Uma porcentagem muito pequena da população do país possui uma receita disponível suficiente para querer e poder influenciar o processo político, mediante consideráveis quantias doadas para fundos de campanha” (SAMUELS, 2003, p.381).

[2] Dentre as figuras mais abaladas com o escândalo destacam-se o então Ministro da Casa Civil, José Dirceu, e o então presidente do PT, José Genoíno. José Dirceu foi apontado como sendo um dos “cabeças” do esquema e foi acusado por Jefferson de chefiar indicações para cargos em estatais com o objetivo de captar recursos para o PT. Dirceu deixou o Ministério e perdeu seus direitos políticos até 2015. José Genoíno foi denunciado por corrupção, acusado de negociar o pagamento a parlamentares em troca de apoio político. Renunciou à presidência do partido e foi eleito deputado federal em 2006 (Folha Online de 09/09/2005).

[Retirado de Igualdade política e financiamento de campanhas eleitorais, Cristiane Rachel Pironi.]